... a defesa das ideias


Às quartas • 22/01/2003
Ana Pires Sequeirapor Ana Pires Sequeira
(
professora do Departamento de Línguas
da
ESE de Setúbal)


A formação dos professores

Em “tempos” de acreditações, avaliações e interrogações sobre o futuro da formação de professores não podemos fechar os olhos... cruzar os braços... temos sim que divulgar o que fazemos, e defender o que “ainda” acreditamos... ou seja, uma formação de professores em que a teoria e a prática se articulem e se interliguem e promovam uma prática pedagógica integrada, ao longo de todo um curso...


Curso de licenciatura em Ensino Básico – 1º Ciclo da ESE de Setúbal / breve historial

A ESE de Setúbal tem desde o seu início promovido, em todos os seus cursos de formação de professores, uma prática pedagógica integrada. O Curso de licenciatura em Ensino Básico – 1º Ciclo é disso testemunho.

A transição do curso de bacharelato para a licenciatura constituiu uma oportunidade para repensar e recriar o projecto de formação. Assim, o actual curso foi concebido a partir da análise e reflexão sobre toda uma experiência acumulada através dos vários anos de cursos de bacharelato,  de trabalho (no terreno) com professores do 1º ciclo, e dos diferentes desafios identificados que se colocavam (e colocam) à profissão docente.

A esta diversidade de referências identificadas e produzidas na própria Escola aliaram-se outras, como a partilha de experiências com especialistas nacionais e internacionais, na área de formação de professores. É, neste contexto, que Phillipe Perrenoud é convidado para um encontro de trabalho. O trabalho resultante do encontro com este especialista foi um contributo essencial para a base de construção do currículo, sustentado na formulação de competências.

Outras referências foram, também, fundamentais. A leitura e a análise de obras na área de formação de professores é um exemplo, bem como, a legislação relativa ao ensino superior e, em particular, a direccionada para a formação inicial de professores.

Assim, a concepção do projecto de formação do Curso de licenciatura em Ensino Básico – 1º Ciclo teve como princípio orientador: a construção de um perfil geral de desempenho baseado em competências.

Pode afirmar-se que este projecto de formação foi (é) um projecto inovador. Um projecto de formação sustentado na ideia de que a profissão docente se deve afastar do modelo profissional de técnico e de funcionário, visto a sua função não ser a de aplicar modelos pré-formatados, mas a de os conceber e de os modificar face ao conhecimento prático adquirido nas diferentes experiências vivenciadas, e da reflexão sobre as mesmas, tendo como suporte as teorias educacionais e os valores e crenças pessoais. Temos, assim, um perfil de profissional reflexivo capaz de se integrar e compreender uma comunidade, definir metas, resolver problemas, gerir o currículo, conceber e implementar  projectos adequados e, ainda,  reflectir sobre o seu próprio percurso profissional/formativo.

Este breve historial conduz-nos ao papel da Prática Pedagógica no curso e a uma concepção do exercício da profissão docente de uma forma mais construtiva, interactiva e reflexiva.


A Prática Pedagógica e o Curso de licenciatura em Ensino Básico – 1º Ciclo da ESE de Setúbal

A Prática Pedagógica é o eixo estruturante do projecto de formação do Curso de licenciatura em Ensino Básico – 1º Ciclo, e organiza-se em torno de uma lógica sequencial de quatro disciplinas correspondentes, respectivamente, a cada ano do curso.  São as disciplinas de Prática e Reflexão Pedagógica I, II, III e IV.

Num currículo sustentado para o desenvolvimento de competências, a Prática Pedagógica procura, progressivamente, trabalhá-lhas em articulação com os outros intervenientes no processo de formação, nomeadamente, todas as outras áreas científicas  do curso. Pretende-se, assim, possibilitar aos alunos um suporte que lhes permita irem-se apropriando do que têm de saber e saber fazer em cada situação e momento de formação afim de propiciar um processo que se pretende reflectido, clarificado e eficaz para todos os intervenientes.

As disciplinas de Prática e Reflexão Pedagógica estão concebidas como um percurso contínuo e gradual, onde a complexidade da profissão docente é vivida, observada, analisada e reflectida nas suas diferentes dimensões, de forma igualmente contínua e progressiva, em responsabilidades e tarefas cada vez mais abrangentes. Os estágios fazem parte integrante deste processo e destas disciplinas, e organizam-se numa perspectiva de continuidade e responsabilidade progressiva dos alunos, aprofundando o ser, o saber ser e o saber fazer do aprendiz de professor.

Trata-se de um processo gradual de observação de diversos contextos e dinâmicas educativas, no 1ºano do curso, à observação de aulas e ao assumir da prática pedagógica, por períodos cada vez mais longos, a partir do 2ºano do curso, em escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico.

Por ser um processo gradual os alunos iniciam o estágio com crianças do 3º ou 4º ano de escolaridade (2ºano do curso), visto tratar-se de anos de escolaridade onde as aprendizagens iniciais já estão mais consolidadas. O estágio prossegue no 3ºano do curso em turmas do 1º ano de escolaridade, tendo assim, os alunos a oportunidade de contactar com o início das aprendizagens formais, continuando o estágio, no 4º ano do curso, com a mesma turma, agora, no 2º ano de escolaridade.

Os estágios realizam-se em várias escolas do distrito, inserindo-se no que sempre foi  assumido pela  ESE de Setúbal como um factor a privilegiar, ou seja um factor enriquecer e propiciador de um contacto directo dos alunos com as diferentes realidades do 1º Ciclo e da profissão docente. Assim,  o estagiar em diversas escolas, diversas turmas e em diferentes anos de escolaridade possibilita aos alunos a vivência de experiências diversificadas, nomeadamente com crianças de sexo, idade, nível de desenvolvimento, religião, língua, ambiente social e cultural diferente, de modo a aprenderem a (inter)agir de forma adequada face à diversidade.

Todo este projecto de formação aglutina diversos intervenientes, nomeadamente todos os docentes do curso, com incidência nos de Prática e Reflexão Pedagógica, os docentes das escolas e das turmas onde se desenvolvem os estágios, as crianças e as suas famílias num processo que se pretende ser “um vaivém entre ideias e experiências, entre teoria e prática, tornando possível o ciclo recursivo entre aprendizagem simbólica e aprendizagem experiencial” (Canário; 2001).