por
João Pires
(Professor Assistente
do Departamento de Artes Plásticas da ESE)
Continuamos a não educar os nossos
alunos para a cidadania. Continuamos
a não explicar o que é a liberdade,
o que custou ganhá-la e o que custa mantê-la
É
engraçado, já no ano anterior, a minha intervenção neste espaço foi sobre a
greve e os movimentos de luta estudantil. Os recentes acontecimentos
ocorridos no campus do Politécnico fizeram-me recordar esse artigo e
encontrar inspiração (ou falta dela) para este.
Há alguns anos atrás
estava eu do outro lado da barricada, no lado dos estudantes, contra uma
propina que considerava injusta e inglória. Eu, presidente da Associação de
Estudantes da Escola Superior de Educação de Setúbal (ESE), sempre lutei
contra as propinas. Eu, estudante da ESE, numa época em que a escola não
sofria restrições orçamentais tão graves, fui contra o pagamento desta
injusta taxa. Mas eu, tal como muitos outros, sempre pautei a minha conduta
por um princípio: o respeito. Respeito pelos outros e respeito pela sua
liberdade.
Lamento que este princípio
tenha agora sido atropelado por duas vezes em tão curto espaço de tempo.
Primeira, numa invasão
estudantil do anfiteatro da ESE, numa altura em que se encontrava a intervir
o Arq. Siza Vieira, orquestrada por alunos da Escola Superior de Ciências
Empresarias, que irrompem e agridem verbalmente todos os presentes.
Pergunto: que mal terá feito Siza Vieira para que o insultassem de modo tão
grave?
Segunda, aquando do
encerramento a cadeado das escolas do Politécnico, impedem-me de me deslocar
ao meu local de trabalho, agredindo a minha liberdade pessoal.
Portanto, fui agredido
duas vezes. Eu, que me bato pelo fim das propinas.
Continuamos a não educar
os nossos alunos para a cidadania. Continuamos a não explicar o que é a
liberdade, o que custou ganhá-la e o que custa mantê-la. Toda a classe
estudantil actual não sabe o que é liberdade, porque nunca viveu sem ela,
porque nunca ninguém lhe explicou o que é. E a liberdade é uma faca de dois
gumes, que tanto funciona para quem luta a favor, como quem luta contra.
Quando os dois lados colidem, terá algum discernimento para moderar este
embate? Salvo alguns elementos do movimento associativo estudantil, poucos
terão consciência política.
E a política também se
ensina.
A comunicação social tirou
bastante proveito de toda esta agitação social, evidenciando alunos com
posses económicas, sem problemas financeiros. Mas não nos podemos esquecer
dos outros. E não podemos, nem devemos, esquecer que toda esta questão surge
como fruto de um país em crise. Um país com aumentos congelados, com escolas
a funcionar a tostões, com profissionais no desemprego. Este país já não
está de tanga. A tanga foi vendida e agora tapamos o pudor com as mãos, na
esperança de que ninguém venha pedir mais esforços pela nação.
Com tantos problemas, há
uma questão que ninguém coloca: quem vai pagar a factura destes tempos?
Com tantos cortes
orçamentais, propinas que não cobrem despesas e descontentamento da
comunidade escolar, como fica o “estado da educação”?
Não investir na educação é
penhorar o futuro do país. Ou alguém acredita que sem profissionais
qualificados podemos acompanhar o progresso na Europa? Passaremos a contar
com os profissionais formados no estrangeiro, como já fazemos na medicina?
Toda esta situação
coloca-me sérias apreensões sobre o futuro que terá o meu filho,
recém-nascido. |