por
Albertina Palma
(Professora do
Departamento de Línguas da ESE)
Felizmente, há professores
Há algum tempo atrás
circulava na Internet um texto de um jornalista russo, publicado no Pravda,
sobre Portugal. Dizia o jornalista que éramos um país de pessoas notáveis,
empenhadas e empreendedoras, capazes de grandes feitos não só passados mas
também presentes, como, por exemplo, a Expo 98 e o Euro 2004.
Em síntese, para rematar o
argumento, dizia que não era à toa que tínhamos conseguido manter a
independência nacional quando outros, como a Catalunha, o País Basco, a
Escócia, etc. não tinham. O problema, dizia o jornalista, era que os nossos
actuais governantes, em vez de enaltecerem as virtudes lusas, contribuíam
para a depressão nacional, o pessimismo e uma baixíssima auto-imagem. Enfim,
não estavam à altura do seu povo.
Isto dizia ele em tempo de
governo Barroso. Em tempo de governo Santana mais difícil é acreditar na
expressão popular, que frequentemente se mostra errada, de que cada um tem
aquilo que merece e cada povo tem o governo que merece. Nada mais errado. O
que acontece é que muitas vezes o povo precisa de tempo para elaborar uma
estratégia de conquista daquilo que merece, porque nada cai do céu, antes
tem que ser construído, conquistado e defendido passo a passo, recuperando
esforços ainda quando parece que está adormecido.
Passemos do geral ao
particular. Falemos de educação, de escolas, de meninos. Falemos de
professores. Os professores são um daqueles grupos de profissionais com
capacidade para fazer diferença na vida das pessoas, com pequenos gestos ou
palavras simples. Não todos, claro, mas alguns professores são por nós
recordados durante a vida inteira por coisas que muitas vezes não têm a ver
com os conhecimentos que nos transmitiram, mas por um novo olhar que nos
proporcionaram e nos ajudou a ver as coisas de outro modo, um valor que nos
guiou para sempre, uma inspiração, um sinal de confiança, de solidariedade,
de humanidade e de esperança que por nossa vez espalhámos pelos outros numa
cadeia de relações e interacções, inter-dependências e afectos.
Há dias, na cidade de São
Paulo, no Brasil, um motorista de táxi, prestável, simpático, que se
responsabilizava pessoalmente pelos seus passageiros enquanto estes viajavam
por aquelas terras distantes e imensas que não se imagina (só a área
metropolitana de São Paulo tem o dobro da população portuguesa!) mostrou uma
sabedoria e uma sensatez, alicerçadas na sua experiência de vida pessoal e
colectiva, que me tocou particularmente. Afirmava ele convictamente que os
professores eram muito mal pagos, o que, ao contrário dos funcionários
públicos, de quem tinha má impressão generalizada, era errado. Os
professores, dizia ele, eram com quem os meninos passavam mais tempo e quem
os orientava para a vida. Tinham um papel muito importante na sociedade e
era de justiça que ganhassem o suficiente para poderem ter um padrão de vida
compatível, o que actualmente só conseguiam se trabalhassem em duas ou mais
escolas, com horários muito sobrecarregados. Estava errado, estava muito
errado, os professores deviam ganhar mais.
Voltemos a Portugal e ao
governo que não merecemos. O problema da educação, dos meninos e dos jovens
portugueses é que não é só este governo. Temos tido sucessivos governos e
ministros da educação que não merecemos. E assim, desde 1986, ano de
consenso nacional em matéria de educação, que se consubstanciou numa Lei de
Bases progressista, realista e sensata, a legislação complementar com vista
à sua implementação mais parece um festival de horrores. Não que tudo tenha
sido mau, considerado individualmente, mas o conjunto acabou por sair
desconjuntado, inadequado, irrealista, injusto, acima de tudo ineficiente e
ineficaz. De tal maneira que, se os professores tivessem levado à risca
todas as determinações sobre currículo, organização, programas, manuais,
avaliação, retenção, gestão, créditos e formação, agrupamentos, etc., duvido
que as escolas ainda estivessem de pé.
Mas não! Para nossa
surpresa, as escolas funcionam. Apesar do sentimento generalizado de
frustração por parte daqueles que são os grandes obreiros da educação
nacional e que poderiam e gostariam de fazer melhor, se tivessem mais meios
e melhores políticas, os professores sabem filtrar a insensatez governativa
e dar um cunho de autenticidade e de realismo à sua tarefa social. São
muitos os exemplos de boas práticas educativas e muitos os professores que
ficam na memória dos seus alunos. Ainda bem, porque aqui, como no outro lado
do Atlântico, são eles que passam mais tempo com os nossos meninos e que os
orientam para a vida. Apesar dos governos e das políticas nacionais, aqui,
como no outro lado do Atlântico, felizmente, há professores. |