... a defesa das ideias


Às quartas 05/05/2004
Luisa Sollapor Luisa Solla
(
Departamento de Línguas da ESE)


Quem é que disse que não são
precisos professores de Francês?

A crónica de Eduardo Prado Coelho publicada no jornal Público de 9 de Março, “A matemática da língua”, suscitou-me uma grande curiosidade porque a relação entre a língua e a matemática que o título anunciava, me pareceu interessante. Mal eu sabia o que ia ler! 

Para quem não leu, em síntese, é o seguinte: foi nomeada uma professora de Matemática para coordenar o ensino do Português em França. Estava explicado o título e gorada a minha expectativa inicial. Mas a história continuava e agora cito EPC: “ A coordenadora do ensino do Português em França não sabe francês e vai para as reuniões com um intérprete ao lado. Ela fala, o intérprete traduz, ela ouve, o intérprete traduz, e assim vai dançando entre duas línguas.” Bom, o meu interesse subiu vertiginosamente, tanto mais que tinha lido a entrevista que a anterior coordenadora, Maria Isabel Barreno (MIB) tinha dado ao Jornal de Letras (nº 872) e também referida por EPC.

Nessa entrevista MIB contava que não tinha conseguido, enquanto coordenadora, ver aprovar pelos governos PS e PSD medidas que fariam, provavelmente, alargar e consolidar o espaço do ensino do Português em França. Aliás, já no seu livro Um Imaginário Europeu (2000), Maria Isabel Barreno tinha escrito: “Às vezes penso também que o nosso pior inimigo é a incerteza, do lado português, quanto aos objectivos prosseguidos: manter os imigrantes ligados a Portugal? Convencer o mundo da importância do Português como língua de comunicação? Conseguir que o Português seja, de facto, uma opção possível no sistema de ensino francês, e não só uma opção rara e pontual? Por estes objectivos me esforço e me dizem que me esforce. Mas o que é um objectivo sem orçamento?”.

E agora pergunto eu, não houve nem há orçamento para executar um plano que permita a realização de pelo menos um dos objectivos de que fala MIB e há orçamento para pagar a um intérprete para uma pessoa que aceitou desempenhar funções que exigem domínio da língua francesa? Para não falar de outras competências...

Conhecedora do que MIB contava na entrevista e relatava no livro, tendo sido, eu própria, professora de Português em França nos anos 70 ( a designação era “Assistente”) e formadora de professores de Francês, enquanto foram precisos, achei inqualificável a situação criada por esta nomeação.

Será que não há em Portugal professores de Português e/ou de Francês, jovens, disponíveis e competentes para desempenhar essa função?

Tratar-se-á (ainda!) de jobs for the boys ou, melhor dizendo, de jobs pour les filles? Ah, mas como a senhora precisa de intérprete digamos que se trata de um job que sai bastante caro ao erário público.

Quatro dias depois li: “Ministro garante que a coordenadora em França fala francês” (Público de 13/03/04). A explicação do Senhor Ministro é lamentável. Só apetece perguntar: Será que também toca piano?

O que fazer então, agora que se sabe pelos jornais desta situação tão insólita quão ridícula? Lamentar? Criticar? Exprimir indignação? Exigir responsabilidades?

O que não se deve fazer é o mesmo que, sobre os candidatos ao Parlamento Europeu, li num título do mesmo jornal (9/03/04): “ Parlamento Europeu não pode ser refúgio dourado ou cemitério de elefantes.”

Eu dou uma sugestão que me parece não só sensata mas coerente com a situação geral no país, no que diz respeito a professores requisitados, caso seja este o caso: fazer regressar a senhora professora de Matemática rapidamente à sua escola de origem. E, claro, nomear para o lugar uma pessoa com todas as competências que a função exige!

O país agradece e o ensino do Português merece!