por Ana Pires Sequeira
(Docente do Departamento de Línguas da ESE)
«Crise
na Educação»???
Nos tempos conturbados por que temos passado, eles falaram…
falaram e só ouvimos: Crise na Educação. Sem
pretensões a uma análise profunda sobre esta temática,
não posso deixar de me interrogar, enquanto cidadã
e docente, se a Educação em Portugal está realmente
em crise ou se esta realidade em que nos movemos “sofre” da mesma
enfermidade do restante país. A esta enfermidade, que designo
por “iliteracia política”, aponto como principais virús
infecciosos, o desconhecimento da realidade, o facilitismo e a leviandade
na tomada de decisões, e ainda, a verborreia dos sucessivos
governos, em particular, dos sucessivos ministros da educação,
que teimam em aceitar cargos, para os quais não têm
as necessárias competências (o saber, o saber fazer,
…).
Após
três dias em que todos fomos chamados a exercer o nosso direito
de cidadãos livres, ou seja, a poder optar pelo perpetuar
da realidade política vigente ou a alterá-la, interrogo-me
como o futuro executivo irá “tratar” o que, também,
designam por «Crise na Educação»!
Será
que vão continuar a falar da «Crise na Educação»
e não vão assumir, de uma vez por todas, medidas que
todos sabemos poderem não ser politicamente convenientes,
ou seja, não serem geradoras de apoiantes, os tais, os votantes,
que possibilitam a perpetuação dos tão desejados
cargos ministriáveis e outros que tais…
Todos sabemos
que qualquer medida estruturante não se compadece com o tempo
vigente de uma legislatura. Todos sabemos que qualquer mudança
tem de emergir, fundamentalmente, dos diferentes contextos de terreno
e, ainda, de ser pensada, concebida e implementada com o envolvimento
dos diferentes intervenientes nesse processo. Todos, também,
sabemos que há que assumir decisões que, nalguns casos,
podem colidir com interesses, nomeadamente financeiros, de alguns
sectores da sociedade.
Todos sabemos:
- o elevado
índice de analfabetismo do país, e da necessidade
de programas de alfabetização e de complemento de
formação de adultos;
- o défice
de oferta de instituições públicas de educação
de infância, e da necessidade urgente do seu alargamento;
- o elevado
número de alunos por turma nos grandes centros urbanos e
periféricos, e da necessidade da sua redução
de modo a que o processo de ensino-aprendizagem seja integrador
de todos os alunos;
- a diminuição
do número de alunos, em algumas zonas do país, e da
consequente extinção de escolas ou dessa ameaça,
e da necessidade de as manter numa perspectiva preventiva contra
a desertificação e o empobrecimento dessas zonas;
- o elevado
número de alunos de nacionalidade estrangeira e cuja língua
materna não é o português, a frequentar as nossas
escolas sem qualquer projecto educativo nacional enquadrador desta
“nova” realidade, e da necessidade de espaços facilitadores
de adaptação à cultura, à língua
e à realidade do país de acolhimento sem descurar
o respeito pela diversidade cultural e linguística e pelo
garante do direito à educação, com a adopção
de medidas, nomeadamente, o recurso a mediadores culturais e linguísticos;
- do desinvestimento
progressivo em recursos humanos, técnicos e financeiros no
apoio a alunos com necessidades educativas próprias, e da
necessidade de garante do direito à educação
destas crianças e jovens promovendo a formação
especializada de professores e a criação de equipas
multidisciplinares;
- do desinvestimento
na qualidade do sistema público de educação,
e da necessidade da sua defesa;
- as “agruras”
das colocações anuais a que grande parte dos professores
estão sujeitos e da consequente e justificável falta
de motivação que tal situação acarreta
a estes profissionais, e da necessidade urgente de alterar as formas
e os tempos actuais de concurso, de modo a que não só
possibilite o início atempado do ano lectivo como lhes facilite
a colocação no local pretendido e, caso tal se não
verifique possam usufruir de subsídios de deslocação
e instalação;
- a falta de
recursos didácticos, de equipamentos laboratoriais, para
não referir mais exemplos, com que as escolas estão
equipadas, e da necessidade urgente de alterar esta situação;
- da publicitação
do equipamento de todas as escolas com computadores e ligação
à Internet, e da necessidade de tal medida ser acompanhada
com recursos financeiros que possibilitem a manutenção
e a aquisição de software adequado;
- da gratuitidade
do ensino ao longo do ensino básico, e da necessidade de
a tornar real, com o seu alargamento aos manuais escolares, ao restante
material necessário e, ainda, aos transportes escolares e
ao incremento de equipas de saúde escolar;
- da proliferação
de manuais escolares, da sua falta de rigor científico, da
sua visão estereotipada da realidade nacional e planetária,
e da necessidade de uma efectiva certificação;
- o “poder”
adquirido pelas empresas editoriais que se sobrepõem aos
programas, “ditando” os conteúdos programáticos e,
nalguns casos, também, se imiscuindo nas metodologias de
ensino, e da necessidade imperativa de delimitar o “poder” destas
editoras e de todas as “benesses” com que foram favorecidas;
- a inadequação
dos programas de ensino à realidade actual, e da sua necessidade
de flexibilização e adequação aos diferentes
contextos regionais e locais e aos efectivos interesses dos destinatários,
viabilizando reais Projectos Educativos de Escola;
- a forma arbitrária
e autoritária como foram “lançados” os agrupamentos
de escola, e da necessidade de um princípio de democracia
e representatividade de todos os membros da comunidade educativa
conducente à construção de relações
de efectiva cooperação.
Todos sabemos!
E, todos “avaliaremos”
este executivo, quer lutando para desocultar o desconhecimento da
realidade, quer o facilitismo ou a leviandade na tomada de decisões!
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